Dexaketo

Simplesmente Gaiato

O Amor é Uma Gata Siamesa!

Leazinha fechou o celular com um suspiro. Era o terceiro convite para um encontro naquela semana, e a resposta, como sempre, fora um “Não, obrigada”. Aos 30 anos, seus amigos insistiam que ela “desse uma chance ao amor”, mas suas memórias guardavam cicatrizes de promessas quebradas: Rafael, que sumiu sem explicação; Marina, que a trocou por uma viagem ao exterior; e Pedro, que preferiu o conforto do tédio à aventura de amar. O mundo dos humanos, decidira ela, era cheio de becos sem saída.

Seu refúgio era um apartamento pequeno, decorado com livros empilhados e almofadas macias, onde Lua, sua gata siamesa de pelagem cor de café, reinava. Adotara-a em um dia chuvoso, dois anos antes, quando a solidão pesava mais que o medo de se machucar. Lua não falava, não prometia, não ia embora. Apenas observava, com olhos âmbar que pareciam entender segredos que nem mesmo Leazinha confessava.

Naquela noite, enquanto a cidade fervilhava em festas e encontros, ela se acomodou no sofá com um chá de camomila. Lua saltou em seu colo, ronronando como um motorzinho desgastado. Leazinha acariciou sua cabeça, sentindo as patinhas quentes afundarem levemente em seu jeans. “Você nunca me cancela planos, né, Luinha?”, sussurrou, sorrindo. A gata esfregou o focinho em sua mão, como se dissesse: “Para quê outros amores se eu estou aqui?”

Na semana seguinte, uma amiga a arrastou para um bar. “É só um drink!”, argumentara Luiza. Leazinha encarou o desconhecido sentado à mesa: sorriso fácil, histórias de viagens, mãos que gesticulavam demais. Ele era… agradável. Mas quando ele tocou seu braço, ela lembrou das vezes em que toques assim precederam despedidas. Desculpou-se e foi para casa mais cedo. Lua a recebeu na porta, miando baixinho, como uma repreensão carinhosa. “Tá bem, você tinha razão”, riu, pegando a gata no colo.

Foi naquela madrugada, porém, que a epifania veio. Leazinha acordou com o barulho de uma tempestade. Tremendo, sentou-se na cama — até perceber que não era o trovão que a assustava, mas a memória de noites passadas ao lado de alguém cujo silêncio doía mais que a solidão. Lua entrou no quarto, pulou na cama e deitou-se sobre seus pés, o peso aconchegante ancorando-a no presente. Ela chorou, então. Não de tristeza, mas de alívio. Percebeu que, enquanto esperava um amor que a completasse, ignorara o que sempre esteve ali: um ser que a escolhia todos os dias, sem discursos, sem condições.

No dia seguinte, cancelou o perfil em apps de relacionamento. Em vez disso, postou uma foto de Lua com a legenda: “Minha parceira de todas as horas”. Luiza comentou: “Isso é fofo, mas um pouco triste, não?”. Leazinha respondeu com uma selfie em que a gata lambia seu nariz. “Tristeza é fingir que não se é amado”, pensou.

Aos poucos, aprendeu a ver beleza na simplicidade daquela relação. Lua a esperava na janela ao entardecer, dividia seu bacon no café da manhã (mesmo sabendo que não devia) e ocupava o espaço vago no sofá como se fosse uma extensão dela. Não havia inseguranças, não havia idas e vindas — apenas um afeto quieto, constante.

Quando amigos perguntavam se não sentia falta de paixão, ela respondia: “Já tenho tudo”. E era verdade. Descobrira que o amor não precisava ser grandioso ou doloroso; às vezes, era apenas uma gata ronronando no colo, ensinando-a que a melhor paixão é aquela que não exige que você se torne menor para caber nela.

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