Dexaketo

Simplesmente Gaiato

Uma História de Amor

Leazinha surgiu na pequena vila à beira-mar como um raio de luz entre névoas etéreas, envolta em véus brancos que o vento insistia em desfazer. Seus olhos, cor de âmbar sob o sol poente, refletiam a intensidade de uma alma sensível, capaz de chorar ao ouvir o canto de um sabiá ou sorrir diante da flor mais singela. Bernardo, jovem poeta de coração fervoroso e caderno sempre à mão, viu-a pela primeira vez durante uma tempestade — ela corria descalça sobre a areia molhada, rindo enquanto os relâmpagos cortavam o céu. Foi amor imediato, quase místico, como se seus destinos já estivessem entrelaçados nas páginas de um romance épico. Ele compôs versos apaixonados sob a lua cheia, jurando fidelidade eterna, enquanto ela respondia com cartas escritas em tinta violeta, seladas com cera e promessas. Viviam em um mundo onde o sentimento era tudo: o sofrimento por ausência tornava-se sublime, o amor, uma força transcendental capaz de vencer o tempo e a morte. Apesar das famílias contrárias e dos rumores que circulavam pela aldeia, eles acreditavam piamente que o coração, quando verdadeiro, jamais seria derrotado. Suas noites eram feitas de juras sob as estrelas, e cada encontro parecia um ato de rebeldia contra um mundo que não entendia a pureza de seu afeto.

Com o passar dos anos, contudo, a realidade impôs-se com frieza implacável. Leazinha foi obrigada a casar-se com um comerciante abastado de cidade vizinha, escolha ditada pela necessidade financeira e pela pressão social. Bernardo, desiludido, abandonou os versos e tornou-se professor de literatura em uma escola pública, levando uma vida modesta, marcada pela rotina e pelo silêncio. Os dois cruzaram caminhos novamente dez anos depois, numa feira de livros: ela, agora viúva, com olheiras fundas e um filho de seis anos; ele, grisalho prematuramente, mas ainda com o mesmo brilho discreto nos olhos. Conversaram com parcimônia, medindo palavras, conscientes das cicatrizes do tempo. Não houve explosões românticas, apenas o reconhecimento mútuo de que o amor não morrera — apenas adormecera sob as cinzas do cotidiano. Com calma, começaram a se encontrar aos domingos, primeiro para conversar, depois para caminhar, até que decidiram, com maturidade e lucidez, reconstruir juntos o que o destino interrompera. O novo amor não era mais o fogo devastador da juventude, mas uma chama serena, sustentada pelo respeito, pela experiência e pela escolha consciente de permanecer lado a lado.

Os Anos passaram e em um espetáculo de vanguarda no Theatro José de Alencar, Leazinha e Bernardo subiram ao palco durante uma noite de arte moderna. Ela, agora poetisa libertária, recitou um poema em versos livres, desconstruindo mitos do amor romântico e celebrando o afeto como construção cotidiana. Ele, ao piano, improvisou uma melodia desafiadora, cheia de dissonâncias e ritmos urbanos. O público aplaudiu com fervor, mas o verdadeiro triunfo estava nos olhares trocados entre eles — cúmplices, irreverentes, felizes. Abandonaram as convenções, moraram num apartamento colorido no Outeiro, em Fortaleza, onde recebiam artistas, escritores e sonhadores. Criaram o filho dela como se fosse de ambos, fundaram uma revista literária ousada e viajaram o Brasil em busca de novas vozes. O amor deles, afinal, não precisava de idealizações: era moderno, vivo, plural. Casaram-se numa cerimônia simples, regada a músicas populares e poesia concreta, declarando que o verdadeiro romance não está no destino, mas na coragem de reinventar o amor todos os dias.

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