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Simplesmente Gaiato

Favela de Santa Helena

Bernardo sempre fora um homem de visão. Empresário bem-sucedido, ele transformava sonhos em negócios lucrativos e construía arranha-céus que pareciam desafiar à Deus Seu mais recente projeto era ambicioso: demolir a favela Santa Helena, uma favela localizada em uma das regiões mais valorizadas da cidade, para erguer ali um luxuoso complexo habitacional chamado “Gran Cielo”. Para ele, aquele terreno seria perfeito para atrair investidores internacionais e garantir ainda mais prestígio ao seu império.

Mas Bernardo não contava com Leazinha.

Leazinha, aos 25 anos, já era conhecida como a voz incansável de Santa Helena. Filha de moradores locais, ela cresceu entre as vielas estreitas e coloridas da comunidade, aprendendo desde cedo o valor da luta coletiva. Formada em Direito através do PROUNI, ela havia retornado à favela disposta a usar seus conhecimentos para proteger o lugar que amava. Quando soube dos planos de Bernardo, imediatamente começou a mobilizar os moradores, organizando reuniões, articulando protestos e buscando apoio jurídico para impedir a remoção forçada.

A primeira vez que Bernardo viu Leazinha foi durante uma audiência pública sobre o futuro da favela. Enquanto ele apresentava seus gráficos e projeções financeiras, ela levantou-se calmamente no meio do auditório lotado. Com firmeza na voz, questionou cada ponto de sua proposta, destacando os impactos sociais devastadores que a remoção causaria. Ele ficou impressionado — não apenas pela envolvente beleza, mas também pela paixão com que defendia sua causa. Era algo que ele nunca tinha visto antes.

Nos meses seguintes, Bernardo tentou várias vezes negociar diretamente com os líderes da comunidade, mas sempre encontrava Leazinha à frente. Ela era incansável! Aliás, Leazinha foi a responsável direta por conseguir uma liminar judicial que suspendeu temporariamente os planos de demolição de cada humilde casa de Santa Helena. A Cada tentativa judicial de Bernardo, uma vitória dela, o que era um golpe contra interesses de um cara que nunca soube perder, e isso o deixava furioso. No entanto, quanto mais resistência ela oferecia, mais ele se via intrigado por aquela mulher determinada.

Um dia, após outra frustrante derrota nos tribunais, Bernardo decidiu confrontá-la pessoalmente. Ele a encontrou em um pequeno centro cultural da favela, onde ela dava aulas gratuitas de direitos civis às crianças da comunidade. Ao vê-la cercada por risos e sorrisos infantis, sentiu algo diferente — admiração, talvez? Ou talvez fosse amor?

“Você sabe que eu poderia te dar tudo”, disse ele, aproximando-se enquanto ela guardava livros em uma prateleira improvisada. “Dinheiro, segurança, status… Você não precisa continuar lutando assim.”

Leazinha olhou para ele sem medo. “Tudo o que eu preciso está aqui”, respondeu, apontando para as casas simples ao redor. “Minha casa, minha família, meu povo. Isso é inegociável.”

Bernardo insistiu, tentando convencê-la de que ela merecia algo melhor. Mas Leazinha permaneceu irredutível. Foi então que ela revelou seu trunfo: documentos sigilosos que provavam irregularidades nas licenças ambientais do projeto “Gran Cielo”. Caso fossem divulgados, poderiam resultar em multas pesadas e danos irreparáveis à reputação dele.

“Eu não quero machucar você ou sua empresa”, disse ela, com calma. “Mas também não abrirei mão do meu povo. Se você desistir do projeto, esses papéis serão destruídos. Caso contrário…”

Foi a primeira vez que Bernardo sentiu vulnerabilidade. Ele sabia que perderia muito mais do que dinheiro se aquelas informações viessem à tona. Após poucos minutos de reflexão, tomou sua decisão: anunciou publicamente que estava abandonando o projeto e prometendo buscar soluções urbanísticas que beneficiassem tanto os moradores de Santa Helena quanto a cidade como um todo.

Embora tenha sido uma vitória monumental para Leazinha e sua comunidade, ela não celebrou sozinha. Em vez disso, usou o momento para propor um plano de desenvolvimento sustentável para Santa Helena, envolvendo melhorias na infraestrutura, programas educacionais e incentivos para pequenos negócios locais. Inspirada pela resistência de seu povo, ela provou que era possível crescer sem destruir.

Quanto a Bernardo, ele continuou sendo um empresário de sucesso, mas passou a enxergar suas obras sob uma nova perspectiva. Embora nunca tivessem ficado juntos romanticamente, ele admirava Leazinha à distância, reconhecendo nela uma força que mudara sua vida para sempre.

Santa Helena permaneceu de pé, não apenas como uma favela, mas como um símbolo de resistência e esperança. E, no coração de Bernardo, Leazinha permaneceu como a mulher que ensinara a ele que algumas batalhas são melhores perdidas quando se trata de preservar o que realmente importa.

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