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Amélia e Josefina – Em Busca da Felicidade

As famílias felizes se parecem, mas as famílias infelizes, essas não – cada uma é infeliz à sua maneira. Josefina seguia bem esse panorama. Era casada, tinha filhos aos montes, terras a ponto de arder na vista, onde o sol não iluminava, e o Estado… bem, ele serviria para a garantia da liberdade para ter diversos filhos e da propriedade privada, tais quais Locke propunha há anos. Josefina tinha tudo aquilo que uma mulher precisava: procriação, comida e terra, o grande amor da vida de alguns. Ela era feliz.
Amélia não. Amélia propalava a quem quisesse ler, ouvir ou ver que não era feliz. Tinha contas a pagar, um marido imprestável e filhos que sugavam a sua alma com despesas infindáveis em escola, lazer, fonoaudióloga, professora de Ioga, futebol de salão e bonecas Baby alive que custavam os olhos da cara. Amélia chorava todas as noites como muitas outras mulheres por aí, afinal a infelicidade, em um mundo globalizado, já não era mais tão particular assim.
Amélia era a inestimável colega de trabalho de Josefina, que, apesar de ter terras e mais os absurdos de filho, ainda tinha um amor irreparável pelas suas joias, coleções para um só pescoço e um só par de orelhas.
Na semana do dia 22 de dezembro, pertinho do natal, Josefina anunciou que ia deixar o marido. E o deixou. Sem ao menos discutir a relação, deixou-o, cinco minutos depois. O marido tinha uma amante grávida e apaixonada, querendo que os filhos de Josefina passassem as festas com eles, em processo de divórcio e disposta a aceitar as ofertas da irritada ex-esposa. Josefina não tinha esses amores todos pela sua tão instituída família, como tivesse podido imaginar o caro leitor, então.
Em setembro do mesmo ano, pouco tempo antes, Amélia largara o marido, alegando as causas naturais da idade – ele não sabia mais afinar as cordas de seu violão, tampouco tocava com precisão mais que três acordes do instrumento de Amélia –, era, de fato, um cônjuge imprestável. Em outubro, Amélia saiu do emprego, deu a louca após pedir um período de recesso para resolver sua vida e engravidou.
Josefina logo descobriu a inversão de papéis, deixou os inúmeros filhos com o pai, tomou metade das propriedades privadas do marido, na divisão de bens, incluindo casas com piscina, mansões na serra e um lote ou dois de rebanhos, viajou para as Maldivas e começou a ser feliz, à sua maneira, fora das responsabilidades sociais e delegações familiares.
Amélia, que então tinha experimentado a infelicidade de um marido negligente quanto às obrigações maritais, filhos caros, passou a ser sustentada pelo amante, comer do bom e do melhor, a chegar a orgasmos múltiplos todos os dias, alcançando, pois, a tão esperada felicidade.
Com o tempo, Amélia viu que a felicidade constante não era lá essas coisas e que tinha sido infeliz em todas as famílias pelas quais havia passado, e que fora especialmente infeliz, a seu tempo, do seu jeito, da sua maneira.

Laís Carneiro

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